Descontrolo, vazio sentido amarga a alma. Semblante triste e ofegante abraça sombras de corpos que se procuram. Mordaz silencio impera no coração Vozes ao escuro, gritos de lágrimas que se perdem no rosto. O cheiro do mar logo ali, invadindo janelas entreabertas. Vago sentir. Alguém grita por alguém procura-se algo. O nada torna-se o sentido de tudo. Aonde estou? Quem sou? Quem fui e serei? Inúmerasinterrogações no silencio da alma. Uma luz acesa nãoserá o mesmo que uma luz apagada, mas no escuro o nada pode ter outro sentido, talvez o sentido que se procura.
Vamos pela vida intercalando épocas de entusiasmo com épocas de desilusão. De vez em quando andamos inchados como velas e caminhamos velozes pelo mar do mundo; noutras ocasiões - mais frequentes do que as outras - estamos murchos como folhas que o tempo engelhou. Temos períodos dourados, em que caminhamos sobre nuvens e tudo nos parece maravilhoso, e outros - tão cinzentos! - em que talvez nos apetecesse adormecer e ficar assim durante o tempo necessário para que tudo voltasse a ser belo.
Acontece-nos a todos e constitui, sem dúvida, um sinal de imaturidade. Somos ainda crianças em muitos aspectos. A verdade é que não temos razões para nos deixarmos levar demasiado por entusiasmos, pois já devíamos ter aprendido que não podem ser duradouros. A vida é que é, e não pode ser mais do que isso. Desejamos muito uma coisa, pensamos que se a alcançarmos obtemos uma espécie de céu, batemo-nos por ela com todas as forças. Mas quando, finalmente, obtemos o que tanto desejávamos, passamos por duas fases desconcertantes. A primeira é um medo terrível de perder o que conquistámos: porque conhecemos o que aconteceu anteriormente a outras pessoas em situações semelhantes à nossa; porque existe a morte, a doença, o roubo… A segunda fase chega com o tempo e não costuma demorar muito: sucede que aquilo que obtivemos perde - lentamente ou de um dia para o outro - o encanto. Gastou-se o dourado, esboroou-se o algodão das nuvens. Aquilo já não nos proporciona um paraíso. E é nesse momento que chega a desilusão, com todo o seu cortejo de possíveis consequências desagradáveis: podem passar-nos pela cabeça coisas como mudarmos de profissão, mudarmos de clube, trocarmos de automóvel ou de casa, divorciarmo-nos… E, então, surge o desejo de partir atrás de outro entusiasmo: queremos voltar a amar… Nunca mais conseguimos aprender o que é o amor. Se nos desiludimos, a culpa não está nas coisas nem está nas outras pessoas. Se nos desiludimos, a culpa é nossa: porque nos deixámos iludir; porque nos deixámos levar por uma ilusão. Uma ilusão - há quem ganhe a vida a fazer ilusionismo - consiste em vestir com uma roupagem excessiva e falsa a realidade, de modo a distorcê-la ou a fazê-la parecer mais do que aquilo que é. Quando nos desiludimos não estamos a ser justos nem com as pessoas nem com as coisas. Nenhuma pessoa, nenhuma das coisas com que lidamos pode satisfazer plenamente o nosso desejo de bem, de felicidade, de beleza. Em primeiro lugar porque não são perfeitas (só a ilusão pode, temporariamente, fazer-nos ver nelas a perfeição). Depois, porque não são incorruptíveis nem eternas: apodrecem, gastam-se, engelham-se, engordam, quebram-se, ganham rugas… terminam. P.S. 1 - Aquilo que procuramos - faz parte da nossa estrutura, não o podemos evitar - é perfeito e não tem fim. E não nos contentamos com menos de que isso. É por essa razão que nos desiludimos e que de novo nos iludimos: andamos à procura…
P.S. 2 - De resto, se todos ambicionamos um bem perfeito e eterno, ele deve existir. Só pode acontecer que exista. Mas deve ser preciso procurar num lugar mais adequado. UTOPIA PURA!